eauriz entrevista: Sidney Marciano
Quem conta hoje para o eauriz a sua história é o Sidney Sharihotsu Marciano. Sidney tem 35 anos, mora em Sorocaba/SP e começou a perder a audição aos 17 anos. Ele possui Neurofibromatose tipo 2 (NF2), doença que pode causar surdez por conta dos tumores que podem ocorrer pelo corpo, incluindo nos nervos auditivos. Ele passou por reabilitação auditiva com implante de tronco encefálico.
Confira a entrevista completa:
Conte-nos sobre o histórico da sua surdez e sobre como foi a decisão de realizar o implante de tronco encefálico (ABI).
Eu estava com 17 quando minha audição começou a diminuir. Passei por diversos neurologistas e muitos não souberam diagnosticar ao certo. Até que passei por um otorrinolaringologista aqui na cidade de Sorocaba, chamado Dr. Fabricio Parra Brito, devo muito a esse homem, tenho uma gratidão enorme. Ele através de exames, me diagnosticou com a NF2. Foi 100% honesto comigo, falou que havia risco da perda da audição e recomendou buscar atendimento no Hospital das Clínicas, da cidade de São Paulo. Chegando lá tive, contato com o Dr. Rubens de Brito. Na época, ele era o responsável por selecionar os candidatos ao implante de tronco encefálico (ABI). Dr. Rubens me passou todas as coordenadas e me explicou como seria o implante. É importante ressaltar que ele nunca me deu a CERTEZA que eu voltaria a ouvir. Ele apenas disse que eu poderia perceber sons e/ou voltar a ouvir. Após várias etapas, conheci a psicóloga Rosa Maria e a fonoaudióloga Dra. Valéria Goffi.
O que me motivou a fazer a cirurgia foi a forma como me trataram, o modo de explicar o procedimento e tudo mais. Isso aconteceu em 2005. E eu fiquei naquela, já não estou ouvindo, vou tentar e ver se consigo voltar a ouvir. Após conversar com o Dr. Rubens marcamos a cirurgia. Confesso que estava com medo, mas o medo anula a fé… eu tentei e para minha sorte deu certo!
Como é sua rotina atualmente em relação a reabilitação auditiva? Que tipo de acompanhamento você realiza?
Em relação aos primeiros procedimentos realizados para reabilitação auditiva atualmente é bem suave. Costumo dizer que tive sorte de encontrar essa equipe e por sempre estarem dispostos a me deixarem ouvinte. Como tive paralisia facial, sequela da retirada do tumor no nervo auditivo, além de aprender a voltar a ouvir, tive que aprender a falar também. Foram inúmeras etapas, até eu aprender a entender tudo de uma maneira clara.
Hoje, faço somente o mapeamento, uma vez ao ano, para ter uma audição melhor.
Quais são os seus desafios em relação a surdez hoje e como você lida com eles?
Para qualquer pessoa surda, a comunicação pode ser mais complicada. Hoje para minha felicidade eu consigo conversar e entender bem o que as pessoas falam, mas, eu aviso antes: “Olha, eu não escuto bem, pode me explicar caso eu não entenda?”. Por exemplo quando vou a uma loja e falo para atendente: “Perdão, não escuto, pode me ajudar?”, “Gostaria de saber disso ou aquilo…” Costumo fazer isso quando vou pedir algum tipo de informação.
Nada como um dia após o outro para superar as barreiras. Não é fácil, nem todas pessoas entendem, algumas viram os olhos, outras dizem que é nada, ou saem de perto para não repetir. Se é difícil? Sim e muito, mas… o baile tem que seguir…
Você trabalha ou já trabalhou com música? Como é sua relação com a música atualmente?
Quando ouvinte eu era músico, tinha um grupo de samba, era sensacional. Conforme fui perdendo a audição, comecei a atravessar o samba… (o termo “atravessar o samba” significa que errou a batida ou a melodia). Hoje ainda tiro uma onda quando dá, mas não com a mesma pegada de antes. Tenho que marcar o tempo certinho e acompanhar o compasso do parceiro ao lado.
Deixa eu contar, certo dia esqueci que era surdo! rsrsrs
Coloquei o fone de ouvido, liguei aquele samba que gosto e sai para caminhar. Cantando o samba esqueci que era surdo, e um carro parou quase em cima de mim! Por pouco não morro atropelado.
O motorista falou: “Tá surdo? Eu buzinei!
Eu falei: “Sou surdo!!”
O motorista: “Mas como? Se está com o fone?”
Então eu mostrei a ele meu aparelho, e ele falou “negócio esquisito”, saiu rindo e pediu para que eu tomasse mais cuidado. rs
Sempre que posso estou no samba ou ouvindo samba pelo fone. Costumo ouvir as músicas que já conheço, acho que fica mais fácil para acompanhar.
Gostaria de divulgar de alguma forma seu trabalho? Conte-nos um pouco sobre sua trajetória profissional.
É bem interessante isso, pelo fato de o mercado de trabalho fechar as portas para as pessoas com deficiência auditiva. Podem achar que por não ouvir a pessoa não conseguirá exercer outras funções. Mas vou tentar vender meu peixe aqui. rs
No ano de 2018 me formei em administração, a minha sonhada faculdade. Cursei de modo presencial, mesmo não escutando bem. Levei tempo para concluir, mas agora estou com diploma em mãos! Também tenho curso de Assistente Administrativo. Possuo experiência em área administrativa e logística. E estou cursando inglês, isso mesmo, um surdo fazendo inglês! Não é fácil, mas é necessário.
Estou tentando entrar na área administrativa, tenho experiencia comprovada em carteira e disponibilidade para mudança de cidade. O que eu preciso é de uma oportunidade!
E-mail para contato com o Sidney: sharitdb@hotmail.com
Em uma pequena frase, dê uma dica para pessoas com perda auditiva.
“Dificuldade é a minha vitamina!” Essa é a minha frase favorita
Você deve ver as oportunidades, escutar seu coração e acima de tudo escutar a sua própria necessidade. É importante ver o lado bom das coisas, das pessoas e principalmente, ver o lado bom da vida!
Dê inúmeras chances a você mesmo! O importante é andar para frente. Cabeça abaixada, somente para rezar. Ouvindo ou não, o olho no olho é o que importa.
Todos nós somos extraordinários, ouvindo ou não, acredite em você!
Qual mensagem você gostaria de deixar para o mundo e para as pessoas que estão lendo essa sua entrevista?
A mensagem é simples: não importa o que está acontecendo, uma hora tudo passa, mas é importante você se atentar e se policiar para saber o que faz, o que tem feito para que as coisas passem da melhor forma possível.
A vida não é um mar de rosas e as vezes você precisa trocar o “Porque eu?” e passar a se perguntar “Para que eu?”
Tenho mais consciência disso, mas me questionei no passado: “Oras, por que eu perdi a audição?” E acreditem, hoje sou um homem melhor do que antes. Após ficar surdo consegui meu diploma, que ironia não?
Seja lá qual for o caminho que você escolher, desbrave e vá até o fim.
Seja o seu maior desafiante!